Depois de anos de denúncias, protestos e críticas, há motivos para surpresas com a Copa? O casamento Brasil e Fifa e seus filhos tortos
Francisco Assis
Colaborador, Lorena
Sete anos. Este foi o tempo que o
brasileiro esperou para receber sua segunda Copa do Mundo. A escolha de 2007,
anunciada pelo todo poderoso da Fifa, Joseph Blatter, caiu como um trunfo
político, em meio à principal crise do Governo Lula, o Mensalão, e assim foi
usada desde então, como moeda de troca entre partidos e governos. No Brasil, a
Copa passou a ser sinônimo de superfaturamento, negociatas, atrasos e
denúncias, muitas denúncias. Mas e para o futebol? Torcedores e jogadores têm
mesmo o que comemorar? E o Brasil?
Estádios velhos, torcedor tratado como
gado, falta de estrutura interna e externa. Estes são alguns dos vários problemas
que sempre estiveram presentes no cenário do futebol brasileiro, mas que
poderiam ter fim com a realização de um mundial na terra de Pelé. Poderiam...
Isso, se a competição não fosse organizada
por uma entidade afundada na lama da corrupção. A Fifa, há tempos, vende seu
principal torneio (aliás, vende todos) a quem fizer a maior oferta. E quando se
fala em oferta, entenda-se melhores condições para o superfaturamento de obras
e contratos irregulares.
Isso se não estivéssemos em um país onde
a prioridade é a política, ou melhor, politicagem com que se trabalha projetos
e eventos de todos os portes.
Isso se não estivéssemos em um país onde
a memória do povo é mais curta que o salário mínimo e os escândalos se repetem,
com seus envolvidos despreocupados, pois eles certamente caem no esquecimento
ao cantar do galo.
Se avaliarmos em termos econômicos, o
Brasil tem sim condições de receber uma Copa, já que a própria África do Sul o
fez em 2010 (mal feita, é claro). Sétima maior economia do mundo, de acordo com
classificação do Banco Mundial, o país poderia organizar uma competição como
essa sem sustos. Mas neste caso, é outro ranking que assusta, e não estamos
falando no famigerado ranking da Fifa, mas sim o da corrupção mundial.
(foto: Chico Batata - Agecom) |
Surpreenderia o mais desavisado
estrangeiro ao pensar: “Mas como a Fifa pode entregar a Copa nas mãos de um
país que ocupa a 72ª posição entre os países que lutam contra a corrupção?”
Pode, mas não deveria.
Fifa e Brasil fizeram um casamento
perfeito. Mas o que podemos esperar são filhos feios, ou pelo menos, bonitos,
mas sem conteúdo. Ou seja, filhos tortos.
A começar pelos estádios. E quando se
fala em estádio por aqui, não podemos começar por outro que não seja o Maracanã,
casa do Mengo de Zico, do Bota de Garrincha, do Vasco de Dinamite e do Flu de
Rivelino. A beleza do futebol dos citados é o contraste da bizarrice dos gastos
com o templo carioca, que ultrapassou os R$ 1,3 bilhão. Aliás, este é o mesmo
estádio que já havia recebido um investimento de R$ 397 milhões para o Pan
2007. Ainda há outros abusos como o Mané Garrincha (R$ 1,495 bilhão) e o Itaquerão
(R$ 1,170 bilhão). “Mas os estádios são belos”, diria o outro. Belos sim, belos
para a Copa. Feios também, feios para o torcedor comum. Basta ver o que
acontece no Maracanã, com arquibancadas padrão Fifa, vazias, vazias, rodadas
após rodadas do Brasileirão, afinal, o ingresso até para o Cariocão era padrão
Blatter.
Abuso também na infraestrutura das
cidades sedes. Soa como piada ruim, declarações da presidente Dilma Rousseff,
que voltou a afirmar na noite desta terça-feira, que as obras de infraestrutura
para a Copa “não voltarão na mala dos turistas". "Uma Copa dura
apenas um mês, os benefícios ficam para toda vida”... Mas e o filho feio,
ninguém leva né...
Mas e nas quatro linhas? Para os
jogadores brasileiros a Copa é a grande oportunidade, certo? Certo. Pelo menos
para os 23 que compõem a Seleção de Scolari, além dos felizes naturalizados,
como Diego Costa.
A Copa vai mudar apenas a qualidade do
gramado (pelo menos por um tempo) para quem atua no Brasil. Ou alguém acha que
o calendário brasileiro vai se adequar ao europeu, só para deixar o Fuleco
feliz? Os salários estarão em dia, após a Copa? Os clubes serão pressionados a
respeitar seus funcionários, evitando atrasos e respeitando os contratos? As
pequenas agremiações terão competições por toda a temporada?
O futebol brasileiro sempre se pontuou
em seus craques para se proclamar o melhor do mundo. Desde 1958, quando a
Seleção de Garrincha e do menino Edson Arantes do Nascimento, bateu a Suécia e
conquistou seu primeiro título, nunca deixamos de chegar a uma Copa como um dos
favoritos, afinal de contas, por aqui, os talentos “brotam em todo lugar”.
Mas hoje, dentro de campo o favoritismo
já não é coisa tão certa assim. O Brasil ainda possui grandes jogadores, mas
quase todos com “usucapião europeu”. Dos titulares que Luiz Felipe Scolari deve
mandar a campo na tarde desta quinta-feira, contra a Croácia, apenas o atacante
Fred atua no Brasil, pelo Fluminense. Nos tornamos um país gerador de mão de
obra, ou, “pé de obra” como diz Juca Kfouri. Isso é reflexo de um futebol
administrativamente fraco. Nenhum time consegue manter seus craques. Um futebol
tão amador, quanto à seleção brasileira que disputou a Copa de 1930.
Mas ficamos tranquilos, pois esta é uma
realidade já esperada. Afinal, o governo Dilma, o COL (Comitê Organizador
Local) do envergonhado Ronaldo Nazário, os governadores (que insistem em jogar
o filho feio no colo da presidente, no é Alckmin?) e Blatter, prometeram uma
organização padrão Fifa, assim como a herança do mundial, padrão Fifa... suja,
corrupta e elitista, ou seja, padrão Fifa.